Brasil: Avaliação Eleições 2020

04/12/2020 08:12

Primeiramente esclarecemos que a avaliação das eleições não passa apenas pelos números de votos das urnas. Uma avalição séria deve passar por toda a conjuntura política e social do país. Caso contrário, não passará de análises frias sobre números e pela manipulação dos mesmos.

O resultado dessas eleições de 2020 tem uma relação intrínseca com o golpe de 2016 que derrubou a presidente Dilma (PT). Portanto, para não cairmos no mesmo discurso derrotista da grande mídia, devemos fazer um breve comentário sobre isso.

O golpe de 2016, que já vinha sendo preparado há alguns anos antes do impeachment da presidente Dilma, teve como objetivos tirar o PT do governo e devolvê-lo à burguesia. Mesmo com um governo de conciliação de classes, o PT no poder incomodava muito a burguesia nacional e também ao imperialismo estadunidense. Precisavam de um governo que atacasse profundamente os direitos dos trabalhadores e que entregasse as riquezas do país ao capital, sem qualquer constrangimento.

Para isso, precisavam destruir o PT e sua principal liderança, Lula, e também o restante da esquerda brasileira para que não tivessem oposição. Como costumamos dizer, um golpe desses não se trata de uma ação em determinado momento. Trata-se de um processo contínuo. A liquidação do golpe seria com o PT e toda a esquerda destruída e desacreditada. Assim, o caminho estaria livre, sem qualquer tipo de oposição à destruição do país e da classe trabalhadora.

Mas, em 2018, nas eleições presidenciais, vimos que o PT ainda estava vivo e que apesar de não conseguir derrotar o candidato do setor golpista, o fascista Bolsonaro, o PT foi para o segundo turno. Como dissemos anteriormente, o golpe trata-se de um processo. Naquele momento, a principal atividade do golpe foi a prisão ilegal de Lula, principal liderança popular do país, impedindo assim a continuidade de sua candidatura. Fizeram isso para garantir a vitória eleitoral da direita.

Foi uma vitória do ódio, Bolsonaro e seus seguidores e apoiadores navegaram nessa onda e se elegeram por todo o país. A direita organizada, PSDB, MDB e DEM, perderam o controle do golpe e foram derrotados pela extrema direita, sendo obrigados a apoiar Bolsonaro no 2º turno.

Quatro anos após o impeachment da presidente Dilma e dois anos após a eleição de Bolsonaro, tivemos mais um embate eleitoral. Se o golpe tivesse seguido seu processo conforme desejavam, hoje teríamos a esquerda destruída, completamente sem forças para a disputa. Além disso, os principais partidos da burguesia, PSDB e MDB estariam dominando o cenário político e crescendo seu domínio nos médios e grandes municípios. Mas não está sendo assim.

Sem sombra de dúvidas, o grande derrotado nessas eleições foi o fascista Bolsonaro. Já no primeiro turno, poucos candidatos a prefeito quiseram seu apoio, mesmo aqueles que surfaram na onda de ódio em 2018. Apenas 13 aceitaram seu apoio explícito e desses apenas 2 conseguiram êxito. Os destaques dessa derrota ficaram com Crivella (Republicanos), no Rio de Janeiro e o Capitão Wagner (PROS – Partido Republicano da Ordem Social), em Fortaleza.

Isso realmente é uma grande derrota para quem conseguiu eleger muitos governadores e parlamentares que se agarraram a ele e a seu discurso de ódio.

Outros setores que também amargam uma derrota desde o golpe são aqueles de centro, principalmente o MDB e PSDB. Esses partidos promoveram o golpe de 2016 com a expectativa de tomarem o poder. Mas, se viram derrotados já nas eleições de 2018, quando suas candidaturas para presidente não decolaram e acabaram por perderem espaço nos governos dos estados e no parlamento. Desde então não conseguem se firmar, pois os partidos do chamado “centrão” que não têm nada de centro, pois na verdade são partidos “fisiologistas”, para ser mais claro, oportunistas que não possuem qualquer ideologia e fecham negociações com base em acordos espúrios, em trocas de favores, de cargos públicos etc.

Infelizmente, o “centrão” é aquele setor que mais vem crescendo desde o golpe. Iniciaram o crescimento apoiados em Bolsonaro e agora continuam crescendo se afastando do mesmo.

O PT e a esquerda em geral continuam perdendo municípios, mas não foram esmagados pelo golpe. Pelo contrário, começam a reconquistar espaço nas grandes e médias cidades. O golpe, o antipetismo e a disseminação de ideias contrárias à esquerda não conseguiu derrotar a esquerda.

Não podemos afirmar, contudo que o bolsonarismo está derrotado. Bolsonaro sai enfraquecido dessas eleições, mas o movimento de extrema direita que ascendeu com a eleição de Bolsonaro ainda é presente.

A campanha da esquerda

 Nas cidades com mais de 200 mil habitantes a esquerda disputou 18 prefeituras no 2º turno e conquistou 5. Se compararmos com as eleições de 2016, quando o PT disputou 7 e conquistou apenas uma, tivemos um avanço. Além disso, em São Paulo, a principal candidatura de esquerda foi Boulos (PSOL), que obteve 40,62% dos votos, ou seja, mais de 2 milhões de votos. Segundo o site UOL, se somarmos os votos do PSOL para prefeitura de São Paulo de 2008, 2012 e 2016, teremos cerca de 289 mil votos. Esses números nos mostram que apesar de não ter conquistado a prefeitura, o PSOL teve uma grande vitória em São Paulo. Além de São Paulo, o PSOL “falou grosso” também no Pará, elegendo Edmilson para a prefeitura de Belém.

O grande erro do PT e da esquerda foi o de não nacionalizar a campanha, com algumas raras exceções. Esta decisão de não denunciar a grave situação em que vivemos pode ser entendida como uma derrota imposta pela própria esquerda que se nega a cumprir o papel de mobilizar os trabalhadores em torno das candidaturas e de suas lideranças. Mostra, também a raiz da crise política e de identidade da esquerda. Essa campanha era para denunciar o golpe, denunciar o governo Bolsonaro, denunciar os ataques aos direitos dos trabalhadores, exigir a revogação das reformas trabalhista e previdenciária, a reestatização de 100% da Petrobras e dos poços de petróleo do Pré-sal, exigir a anulação e extinção de todos os processos contra Lula e as lideranças de esquerda. Enfim, uma campanha para mobilizar a militância, preparando-a para a luta nas ruas.

Enfim, sabemos muito bem para que e a quem servem as eleições burguesas. Em hipótese alguma acreditamos que sejam a solução dos problemas que o capitalismo nos impõe. Estamos diante de uma crise política da esquerda brasileira e para encontrarmos a solução precisamos ir além dos partidos de esquerda atuais. A ilusão de que tudo se resolverá nas eleições de 2022, com a eleição de um governo progressista, com uma ampla aliança, para derrotar Bolsonaro, serve apenas para desmobilizar a classe trabalhadora. Para nós a verdadeira saída está mobilização da classe trabalhadora, dos movimentos sociais e na construção de um partido revolucionário, com um programa que atenda a pauta de reivindicações imediatas e transitórias da classe trabalhadora e que construa o caminho para a derrubada do capitalismo. As eleições burguesas não atenderão as demandas da classe trabalhadora, mas pode e deve ser o momento de abrir o debate com os trabalhadores para mobilizar e construir a verdadeira saída. Somente com um processo revolucionário conseguiremos destruir o estado burguês e construir sobre seus escombros um estado socialista sob o comando dos trabalhadores.

 

Liga Socialista – 03/dezembro/2020