Eleições chilenas: uma vitória das mobilizações
Carlos Magrini
As mobilizações
Em 7 de outubro de 2019, o presidente Sebastián Piñera decretou o reajuste das tarifas do metrô, sendo que em setembro ele já havia decretado um reajuste de 9,2% nas tarifas de energia elétrica. Houve uma reação imediata dos jovens que pularam as catracas do metrô e saíram em um grande protesto e foram reprimidos com violência pela polícia. No dia seguinte as manifestações tomaram conta das ruas. Quanto mais o governo reprimia, mais se espalhava a revolta e a adesão de outros setores que faziam aumentar as reivindicações populares.
O presidente Piñera anunciou a suspensão do aumento da tarifa do metrô e decretou estado de emergência e toque de recolher. Nem assim o movimento cedeu. O povo chileno estava enfurecido e disposto a enfrentar a dura repressão dos carabineiros e militares.
Foi praticamente um ano de luta, que continuou mesmo com o surgimento da pandemia do covid em 2020. Estrategicamente Piñera utilizou da pandemia para arrefecer o movimento, tomando todas as medidas necessárias, inclusive a vacinação em massa do povo, para atenuar as consequências da pandemia.
Além disso, a esquerda que participava das mobilizações, aproveitou o momento para negociar com a direita um “acordo de paz” que propunha um plebiscito para a realização de uma Assembleia Constituinte. A grande maioria dos manifestantes acatou tal acordo e fizeram campanha levando à sua aprovação no plebiscito que definiu para maio de 2021 as eleições dos delegados constituintes. Esse acordo da esquerda com a direita, constou em uma assembleia constituinte com um número reduzido de 155 cadeiras, a paridade de gênero na Constituinte, a possibilidade de candidaturas independentes de partidos e o quórum de 2/3 dos votos, para aprovação da nova Constituição. Portanto, se a direita obtivesse 1/3 das cadeiras, ela conseguiria impedir a aprovação de muitas propostas.
Esse acordo que canalizou a revolta do povo para as vias institucionais foi responsável pelo recuo do povo juntamente com as normas de isolamento, porém, não fez com que esquecessem da política neoliberal de Piñera e sua dura repressão.
Eleições
Embora o voto seja facultativo no Chile desde 2012, 49% do eleitorado foi às urnas mesmo com a pandemia. A presença foi maior que em 2017 quando foi eleito Piñera para presidente. Os movimentos sociais viram o “grande acordo” de novembro de 2019 com relativa frustração, devido a limitação de 2/3 dos votos para aprovar a nova Constituição.
Mesmo assim, os chilenos foram às urnas nos dias 15 e 16/05 para escolher prefeitos, governadores e também os 155 nomes que irão integrar a Assembleia Nacional Constituinte. O resultado representa uma vitória das mobilizações. Para Piñera e seus aliados foi uma grande derrota. Mas, os partidos de esquerda também tiveram suas perdas. O reduzido número de cadeiras para os partidos de esquerda mostra a desconfiança do povo também nesses partidos e não apenas na direita. As candidaturas independentes foram as grandes vitoriosas conquistando 48 cadeiras, deixando claro a rejeição aos partidos de direita e de esquerda. Os independentes são candidaturas muitas vezes ligadas a movimentos identitários e por isso, não podemos prever como será a atuação das mesmas.
As listas dos candidatos independentes somam 48 cadeiras na Assembleia. A lista da direita (Vamos por Chile), aliados de Piñera, soma 38 cadeiras. A lista de esquerda (Apruebo Dignidad), na qual está o Partido Comunista do Chile (PCCh), soma 28 cadeiras. A lista del Apruebo, onde está Concertatión, do Partido Socialista (PS), de centro-esquerda, conseguiu 25 cadeiras. Já os povos indígenas ficaram com 17 cadeiras reservadas a eles. Podemos perceber que tanto o PCCh quanto o PS, tiveram menos votos que a direita, o que serve de alerta para os mesmos.
O impacto desse resultado no mundo capitalista já se fez sentir na segunda-feira (17/05). Segundo o site G1, a Bolsa de Valores do Chile fechou em queda de quase 10%. Além disso, o peso chileno desvalorizou em 2,1% frente ao dólar.
Paridade de gênero
Segundo o site Agência Brasil, essa assembleia constituinte é a primeira na história a ter a paridade de gênero, ou seja, 50% homens e 50% mulheres. Assim, a Constituição será escrita por homens e mulheres em igual proporção.
Segundo site Vermelho (PCdoB) “essa será a primeira Constituição na história do Chile que nasce do voto popular. Caberá a essa Assembleia sepultar de vez a atual Constituição, redigida com tintas privatistas e promulgada em 1980, ainda sob a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990). ”
As eleições para prefeitos e governadores
Além da eleição dos constituintes, o chile realizou junto as eleições para prefeitos e governadores.
A vereadora do Partido Comunista do Chile (PCCh), Iraci Hassler, derrotou o conservador Felipe Alessandri que tentava a reeleição em Santiago, com os comunistas conquistando pela primeira vez a maior prefeitura do país. Daniel Jadue (PCCh) foi reeleito em Recoleta recebendo mais votos do que havia somado nos últimos dois pleitos que havia vencido, desde 2012. Além disso, Jadue é um dos nomes fortes para as eleições presidenciais marcadas para novembro. Além de Santiago e Recoleta, os governistas perderam também em Estación Central, Maipú e Viña del Mar.
Na região Metropolitana, onde está localizada a capital Santiago, a disputa no segundo turno para governador será entre Claudio Orrego, da Unidad Constituyente, que obteve 25,5% dos votos no primeiro turno, contra Karina Oliva, do Comunes, (23,37%), ambos do campo progressista.
Por um partido revolucionários chileno
Certamente, se a assembleia constituinte for fiel ao povo que a elegeu, fará seus trabalhos avançarem no sentido de construírem uma Constituição que garanta os direitos do povo chileno, serviço público estatal de qualidade e para todos, estatização das empresas e riquezas estatizadas, estatização dos bancos privados e impostos sobre as grandes riquezas.
Mas, Piñera, um presidente assassino de seu próprio povo, ainda está no poder e naturalmente haverá uma reação da direita e o povo terá que tomar as ruas novamente para garantir a vitória obtida nas urnas. Com certeza, esse “acordo de paz” foi feito para ser um obstáculo à revolução latente nas mobilizações. Mas, com a vitória desses movimentos também nas eleições, será muito difícil para a direita ou para os partidos de esquerda usarem a Constituinte como forma de enganar o povo.
A Constituinte trará novas mobilizações e o povo chileno deverá entender que a única saída real está na transformação desse movimento em uma revolução socialista e na construção de um Partido Revolucionário Internacionalista, interligado a outros através do Partido da Revolução Mundial. Assim, com esse partido, constituído na luta por bravos militantes revolucionários, a luta do povo chileno poderá se elevar da resistência para a revolução e levará essa saída para outros povos, principalmente da América Latina.
- Viva a luta do povo chileno!
- Fora Piñera!
- Por um Partido Revolucionário Chileno!
- Por uma nova Internacional, a 5ª Internacional!